Por Carolina Fonsêca
Jemima Alves era uma adolescente que não simpatizava com as aulas de educação física do colégio. Para fugir delas, precisava escolher um esporte e praticá-lo. Das modalidades com bola, nenhuma agradava. Apareceu o judô, e ela o escolheu. Foi quando começou a história da sensei rubro-negra, que se tornou a primeira judoca pernambucana a participar de uma Olimpíada, em uma trajetória marcada pela coragem. Aos 53 anos, ela continua se dedicando a ensinar o caminho suave para pessoas de todas as idades.
Aluna do Colégio Pedro Augusto, no Centro do Recife, tinha 16 anos quando pisou no tatame pela primeira vez. O que era só uma fuga das aulas de educação física para cumprir exigências da grade curricular acadêmica se tornou paixão. “Comecei a treinar e gostei bastante. Depois dos primeiros seis meses treinando, conquistei meu primeiro título de campeã pernambucana”, disse, lembrando ainda do seu primeiro professor, o técnico Luiz Mota, que também treinava a equipe do Sport na época. Assim como outros atletas de Mota, Jemima passou a integrar o time de judocas do Leão.
De uma família humilde, a quinta das seis filhas foi a primeira e única pessoa da sua casa a praticar esporte. “Nasci em Olinda. Meu pai trabalhava no Porto do Recife e minha mãe sempre foi dona de casa. Tenho mais cinco irmãs e ninguém nunca tinha praticado esporte na minha casa, tive muitas dificuldades. Meus pais não tinham condições financeiras para me dar apoio no esporte. Não tinha dinheiro para comprar o kimono, por exemplo. Eu comprei um tecido e a minha irmã costurou o meu primeiro kimono”, contou.
Leia Mais: Futsal: Pipa e a missão de formar atletas para o Sport
Leia Mais: Natação foi aliada de Diógenes Melo após atropelamento
A limitação financeira colocou diversas pedras no caminho da judoca, mas nunca a fez parar. Às vezes, faltava o dinheiro da passagem para ir treinar e até para ir competir. Mais do que treinador, professor Mota foi também seu primeiro apoiador. “Ele viu que eu tinha talento e me ajudou muito. Às vezes me dava o dinheiro da passagem para eu ir treinar”, lembrou. Nesse início, ela decidiu que queria um dia disputar as Olimpíadas.
“Eu treinava e me dedicava muito. De manhã fazia minha preparação física – sozinha, né. Não tinha estrutura que os atletas têm hoje. Acordava às 5h e ia correr. Voltava para casa, tomava café e ia para o colégio. Depois do colégio, ia treinar. Isso de segunda à sexta. Aos sábados, só treinava. E os domingos eram para descanso. Na minha época não tinha nada. Era só eu, Deus e a força de vontade”, lembra.
A coragem também era um dos grandes diferenciais de Jemima. Perseguindo sua classificação para os Jogos Olímpicos, ela ia com a “cara e a coragem” disputar seletivas Brasil à fora. “Para o meu pai as filhas tinham que estudar, trabalhar e casar. Esse negócio de fazer esporte? Para ele não tinha isso. Quando eu comecei a treinar eles acharam que fosse só uma fase. Depois notaram que era sério. Quando comecei a sair para disputar competições, eles até não queriam me deixar ir, mas eu batia o pé e ia. Depois de um ano, cederam. E aí vieram as seletivas de Pan-Americano, Sul-Americano….tinha seletiva? Eu ia embora”, contou. Muitas dessas viagens para o Sudeste do País eram feitas de ônibus. Jemima ia de malas prontas para ficar caso fosse classificada.
Tanta coragem e disposição renderam a tão sonhada ida para as Olimpíadas. Jemima integrou a delegação do Brasil nos Jogos Olímpicos de Barcelona, em 1992. A primeira edição que teve a participação de mulheres no judô.
A aluna dedicada do Professor Mota passou a ganhar espaço como professora também. “Eu o ajudava em algumas aulas, depois comecei ensinando aos mais novos. Daí foram surgindo algumas turmas, já no Sport e em seguida outras na AABB”, disse. O judô se tornou também a profissão de Jemima, que sempre viveu do esporte. Atualmente, ela tem cerca de 300 atletas sob o seu comando.
Revezamento da tocha
Antes dos Jogos Olímpicos do Rio 2016, a sensei foi uma das pessoas escolhidas para carregar a tocha olímpica durante o tradicional revezamento que leva um dos símbolos dos Jogos até a abertura do evento. Jemima conduziu a chama olímpica pela Zona Oeste do Recife, no bairro da Madalena, por 200 metros na Avenida Real da Torre.